O Castelo da Neblina

Vizier a encarou em profundo silêncio durante algum tempo. Ele parecia ter muita coisa a dizer, mas manteve-se calado. Zaira não teve um bom pressentimento em torno disso, como se houvesse muito mais coisas que ela deveria saber sobre toda essa história, e como se aquele homem que a observava estivesse bem mais à par de tudo, enquanto ela, a sacerdotisa máxima da Catedral Turandor, não sabia de praticamente nada.

Vizier resumiu tudo aquilo que pensava em uma única e fatídica pergunta:

- E por que vocês desejam matar o Rei Celestial?

Zaira estranhou o que Vizer falou, e pensou por muito tempo com o cenho franzido. Tinha parado tudo o que fazia e ficou mais confusa ainda. Olhou a Ariosto, e ele havia parado de rolar pelo carpete e fazia um silêncio tenso.

- Eu não planejo matar o Rei Celestial - disse sinceramente, mas de um jeito incrédulo. E não planejava mesmo. - Mas farei o possível para proteger a Turandor. - havia determinação na sua voz. - Mas não sei exatamente, ao que parece, os humanos estão achando que o Rei Celestial está querendo destruir a Terra do Exílio. - Sentou numa posição de lótus e apoiando o cotovelo num joelho, seu queixo descansou em seu punho. - Estou certa, Ariosto? - Perguntou ao amigo.

- Sim. - confirmou o gato. - É exatamente isso.

- Hummmm, sabe... - agora ela estava pensativa, não estava entrou em transe como na maioria das vezes entra quando se perde em seus pensamentos, algo estava muito errado nisso. - No entanto, isso é bastante ilógico.- comentou retoricamente. E então olhou a Vizier que ainda a estava encarando em silêncio. - Você tem algo a me dizer? - questionou arqueando um sobrancelha.

- Se você quer ser uma boa líder, tem que pensar muito além daquilo que te dizem ou daquilo que você sabe. - falou ele diretamente. - Por que o Rei Celestial destruiria a Terra do Exílio? Essa é a maior questão de todas, o motivo para matá-lo, e a maneira como matá-lo.

Lümma entrou na sala trazendo mais uma xícara de chá para seu senhor, que bebeu lentamente enquanto refletia olhando para Zaira.

- Nem sempre aquilo que te contam é a verdade, Zaira. Muitas lendas e boatos não passam de invenções das pessoas. Quem lhe garante que de fato o Rei Celestial existe? Tem muita coisa a ser pensada antes de se tomar a decisão de aliar-se àqueles que querem uma guerra. Já refletiu sobre a possibilidade de estar sendo manipulada? O rei de Shandrya sempre quis tomar para si as Terras Celestiais, já passou pela sua cabeça que a chuva de estrelas pode ser só um pretexto que ele usou para poder invadir as terras do sul com a ajuda dos feiticeiros? Afinal, a morte do Vizzerdrix é algo importante para todos nós, ele sabia que isso iria nos abalar.

Ele tomou mais um gole do líquido quente e doce.

- ... e como ele sabe que o Vizzerdrix morreu?



Lümma olhava para a expressão confusa de Zaira.

- A senhora deseja mais chá?

- Não, obrigada. - respondeu um pouco fria demais para Lümma. Depois disso ficou em silêncio. Ela sabia que tinha que pensar além, e por isso havia achado aquelas informações que Ariosto havia dito ilógico. Claro que ela não tinha sido tão específica como Vizer. Mas tinha achado irracional, a Terra do Exílio era o lar do Rei Celestial, como ele poderia destruir a própria casa? Isso não fazia sentindo, e porque os humanos queriam tanto essa aliança com o exilados, quando havia tanto rancor dos humanos para com os exilados? E como eles tinham tanta certeza que o Rei Celestial era um humano?

O Vizier havia falado teve alguma singularidade com o que ela pensou, mas foi muito mais além. E ele poderia ter razão, mas a verdade ninguém realmente saberia... Mas, sim, Vizier sabia de muitas coisas, ela notou isso. Certo, havia tomado uma decisão, já sabia onde iria. Ao invés de ficar fazendo suposições, iria investigar a verdade.

Levantou-se decidida, pegou o mapa e enrolou, colocou-o de volta na bolsa, enquanto a colocava nos ombros e se dirigiu à porta. - Estou indo, você poderia me guiar até lá embaixo? - perguntou a Vizer.

Vizier caminhou até ela, segurando a maçaneta antes que Zaira pudesse tocá-la. Ele olhou para a futura rainha friamente e disse:

- Há algo que você precisa fazer antes de ir.

Então tocou-a nos ombros, trazendo o corpo dela para si. Envolveu-a num caloroso abraço e afastou-se para beijá-la mais uma vez. Apesar da pele de fantasma, Zaira pôde sentir um corpo forte e cheio de vida ao ser tomada pelos braços de Vizier.

- Eu gostaria de ficar perto de você. - ele tocou o rosto dela com as costas dos dedos. - Mas você é poderosa, conseguirá fazer tudo sozinha, como provavelmente sempre fez. Consigo ver em seus olhos sua independência, e isso é algo muito admirável numa mulher.

Vizier deu-lhe um último beijo, suave e delicado, antes de abrir a porta e deixar entrar o frio congelante.

As bochechas de Zaira coraram intensamente diante do elogio de Vizier, impulsivamente ela o puxou para um nojo beijo, dessa vez mais intenso e mais demorado, não um beijou superficial, mas um beijo de língua. Por fim ela mordiscou levemente o lábio inferior do fantasma, para logo depois enfiar a cabeça em seu peito e abraçá-lo fortemente, sentindo todo o vigor seu corpo e sua temperatura.

- Você pode vir comigo se quiser. - propôs ela. - Eu não me importaria, muito pelo contrário, eu ia gostar muito. - não queria ficar longe dele, em pouco tempo esse homem veio e perfurou todas as suas barreiras de um jeito que ela não entendia. Gostava de ser independente, era individualista, egoísta e gostava de ficar no seu mundo, mas ela sentiu que sempre abriria uam exceção para Vizier.

- Não. - disse ele segurando o rosto dela delicadamente. - Você deve ir sozinha.

Vizier virou-se e caminhou até Lümma.

- Leve-a. - ordenou.



- Sim, senhor.

A criada escancarou a porta, que já estava entreaberta. Flocos de neve entraram pela sala junto de uma violenta rajada de vento frio. A elfa se protegeu com as mãos e falou para Zaira:

- Para onde deseja ir? Al está à sua disposição, senhora.

Do lado de fora, a fantasma pôde ver o grande e desajeitado tigre de cristal brincando com pássaros de gelo que voavam em torno dele.

Zaira sorriu ao ver a cena. Virou-se para Lummä, olhando-a e perguntou: - Ele responde ao comando de estranhos? - ele havia gostado dela, mas não saberia se ele iria lhe obedecer. Não disse a Lummä onde iria, bem, ela não tinha certeza ainda, estava indecisa, pois tinha dois lugares em mente, mas não sabia qual escolher. Desceu as escadas e caminhou até o enorme tigre de cristal, ele poderia lhe levar aonde ela queria. Pensou durante vários minutos e por fim decidiu.

O tigre havia parado de brincar, devia ser por causa da sua aproximação. Ela havia ficado em dúvida se ia para Shandrya ou para o Castelo Proibido do Rei Celestial, ela sabia muito pouco e não confiava nos boatos, não confiava no que os humanos estavam fazendo e o que Vizier lhe falou lhe deixou ainda mais confusa e desconfiada. Por isso iria investigar por si mesmo, a coisa mais sensata a fazer seria ir para Shandrya e descobrir o que estava tramando os humanos, mas tinha um mau pressentimento sobre ir lá, e o Castelo Proibido do Rei Celestial triplicava esse mau pressentimento, ambos os lugares definitivamente seriam arriscados. Contundo, havia decidido que iria ao Castelo Proibido.

Al correu na direção de Zaira ao avistá-la, quase destruindo todo o jardim do pátio do castelo no processo. Os pássaros de gelo fugiram desesperadamente enquanto o tigre de cristal ronronava para a fantasma.



- Não se preocupe com isso, senhora. - respondeu Lümma - Al gosta muito de você.

A elfa entrou no castelo e fechou a porta, mais alguns minutos ali fora e iria congelar completamente.

Sherazade acariciou a enorme face do tigre. - Você poderia me levar ao Castelo Proibido? - perguntou suavemente ao lindo animal. Enquanto subia nele pelos cristais ao quais já estava familiarizada.

Al apenas continuou ronronando, esperando por mais carinho de Zaira, mas ao compreender que tinha uma nova missão, abriu as imensas asas e voou pelos céus.

Zaira avisou toda a imensidão gelada, e o tigre de cristal subira tão alto que já era impossível identificar o que estava se passando lá embaixo. Tudo parecia coberto por uma espessa nevoa, então ela se deu conta que os dois sobrevoavam as nuvens.

Enquanto eles sobrevoavam as núvens Zaira ficou extasiada com a beleza da paisagem. Ela sorriu para Al e o abraçou, debruçada sobre o enorme animal ela fechou os olhos e pela pela primeira vez se concentrou, até que sentiu a leve brisa em seu rosto. Ela sorriu diante da sensação e acariciou Al, enquanto se deleitava, por um momento sentiu uma vontade dormir, algo que nunca sentira antes.

Continua > aqui.