A Floresta Enevoada

- Foi ele quem me atacou! Por que não escutam ele?!

Quando John levantou-se e gritou para todos que estava tudo bem, Hatsuko achou que estavam a salvo.

Mas os camponeses não acreditaram. Sua visão apagou e retornou.
Droga, preciso me manter consciente.

Ela viu os camponeses maltrapilhos arrastando Lief.
Não, Lief!
Sentia sua mão que estancava o sangue molhada e quente. Não podia sequer andar, quem dirá salvar Lief.
Malditos sejam os deuses - gritou em pensamento.

John, libertado do encantamento, sentiu-se desnorteado.

- Hã? O que aconteceu?



- Papai, você está bem?



- Onde... onde ele está?

John olhou para trás e viu os camponeses arrastarem Lief consigo. A simples visão daquele garoto o fazia tremer de ódio.

Até que enfim esse pivete resolveu se entregar!

Mas algo estava confuso em sua cabeça, alguma coisa não se encaixava. Não se lembrava de ter ido abraçar Rebecca, mas associou esse fato ao grande perigo que seu filho correu.

Eu devo estar traumatizado...

John esfregou a mão contra o rosto.

Enquanto isso, Hatsuko observava os homens e mulheres arrastando Lief para a neblina.

NÃO! NÃO POSSO DEIXAR FAZEREM NADA COM LIEF! - pensou, desesperada.
Começou a dar passos trôpegos segurando em galhos e troncos que aparecessem pela frente.
Não vou perdê-lo novamente, não vou! Preciso de ajuda não-humana...

- Droga, como eu odeio estas pessoas covardes que atacam em conjunto. Se eu atacar, estou ferrado.

- "♪ Who is the fly in your champagne?
Whose got the body and whose got the brain?
I'll take your blood and I'll kill my pain
You are the one that I desire, you are the dark I'm the vampire ♪" - Lief cantava, calmo. Se deixando ser levado por todos eles.

- Vocês irão se arrepender de matar um inocente. - Disse para a velha dos dentes podres. - Irão se arrepender muito. - E voltou a olhar para cima e continuou sua canção. - "♪ Who is the spy in your campaign?
Is it the wife or is it your advisor ?
I wanna suck the blood from their veins ♪"

- Não vamos te matar. - disse a velha, e Lief pôde sentir o cheiro de seu hálito fétido. - Não somos assassinos como você, garoto.

Os homens jogaram Lief dentro de uma carruagem e o acorrentaram por inteiro.



- Deixem ele comigo à partir de agora. - ordenou John.

Os outros camponeses o obedeceram. John trancou Lief no compartimento dos fundos, lugar onde o vampiro não pôde enxergar absolutamente nada.

Hatsuko observava tudo, viu John entrando na carruagem e pedindo para que os outros cuidassem de sua filha.

- Tem certeza que o senhor vai levá-lo até lá? - perguntou a velha.

- Sim, senhora. - respondeu John trancando a carruagem.

Lief escutou seus passos até o compartimento escuro onde se encontrava, que suspeitou ser uma espécie de caixa. Sentiu John lhe colocando uma mordaça para que o vampiro não fosse capaz de falar. A caixa foi fechada e a carruagem partiu, desaparecendo em poucos minutos em meio à neblina.

- Lief... - murmurou, enquanto observava a carruagem afastar-se com ele.
Ela caiu de joelhos, perdendo muito sangue. Mas aquela dor estava praticamente anestesiada perto da dor de não saber o que aconteceria com Lief.
Por que os deuses nunca são bons?

Uma tempestade pesada começou a cair sobre a Floresta Enevoada e Lief começou a sentir fortes dores preso dentro da caixa escura.

- Droga...

Lief tirou de seu bolso uma de suas facas e tentou se soltar.

Hatsuko começou a arrastar-se pela grama enlameada. Pingos de chuva caiam e escorriam pelo seu rosto como se fossem lágrimas. Talvez fossem, ela nunca saberia dizer.
Os cabelos molhados grudavam na testa e atrapalhavam a visão. Por vezes seus dedos deslizaram e ela quase foi de encontro ao chão.
Não vou cair, se eu cair, provavelmente não levantarei mais.

Lief não conseguia nem arranhar as correntes usando sua faca, mas com muita tentativa conseguira se livrar da mordaça, coisa que o ajudou a respirar melhor dentro da caixa, que estava muito quente e úmida por dentro.

Nesse momento ele ouviu um estrondo, como se a madeira de sua prisão tivesse sido chutada. Mas outra coisa estava acontecendo do lado de fora. Lief escutou uma discussão, homens gritavam com John e com o cocheiro. A carruagem estava sendo roubada.

Os bandidos invadiram e jogaram os homens para fora. Mas eles não sabiam que Lief estava lá dentro. O vampiro sentiu um deles sentando sobre a caixa e comemorando o sucesso do assalto.

Enquanto isso, Hatsuko caminhava pela tempestade em meio àquele ambiente desolado. Em sua memórias só conseguia pensar em Lief e no que poderia ter acontecido com ele. Sentia-se uma criança perdida em meio à névoa infinita.

Eu me tornei tão dependente de Lief. Logo eu, que nunca dependi nem de minha mãe. Pareço uma criança abandonada. Ele era a única coisa que eu tinha.
A camisa de Lief estava suja, molhada e ensanguentada, mas ainda conservava o seu cheiro. Era a única coisa que restava dele. Como um último foco de esperança no qual Hatsuko agarrava-se firmemente.
Mãe, doeu tanto assim quando você amou o... Meu pai? Foi por isso que enlouqueceu?
Ou seria porque, assim como eu, nunca foi correspondida?
Suas mãos e joelhos estavam em carne viva devido ao tanto que se arrastara sobre pedra, grama e lama.

Continua > aqui.