A Morada do Ancião

Um templo que se encontra em algum lugar da floresta de bambus ao norte do reino. Dizem que o homem conhecido como O Ancião tem a resposta para todas as perguntas do mundo.

Guiado apenas pela voz do destino e pelos uivos do vento, Shiki caminhou por cinco dias e cinco noites. Escalou montanhas, atravessou brejos e embrenhou-se na floresta dos bambus. Depois de muito tempo caminhando sobre o solo selvagem, Shiki notou que haviam pedras sob seus pés, pedra lisa e trabalhada por mãos humanas. Ao sentir incalculável fonte de poder, deu-se conta de que chegara à Morada do Ancião. Seus dedos puderam tocar o corrimão de bambu que cercava o caminho para o possível templo. Não podia ter se enganado. Havia encontrado o que tanto procurava.

O estômago roncou. Havia dias que Shiki não se alimentava decentemente e a última vez que bebera água havia sido em uma chuva há dois dias atrás. Seu corpo estava a ponto de entrar em colapso.

Neun estava caminhando em direção à Shiki quando Tod Blunt atravessou o portal que levava até o templo. Finalmente encontrara seu velho companheiro cego.

Shiki estava imundo e parecia fraco, provavelmente estava viajando há muitos dias. O esqueleto não o vira desde o episódio com a serpente nos Pântanos Esquecidos e agora se perguntava o que o parceiro de aventuras havia passado desde então.

- Nossa... - Saindo do portal quase caindo, quando olha seu companheiro Shiki bem desgastado - Shiki, EI SHIKI! - Corrando em diração - O que aconteceu? - Olhando o Shiki no quase desmaiando - Neun... Você pode fazer alguma coisa? Sei que você tem um grande poder, então você ajuda-lo? - Voltando seu olhar para o Neun em quando segura Shiki no chão

- Então você conhece este homem? - Neun olhou para Shiki curiosamente. - Me desculpe, mas não posso fazer nada por ele. A cura é algo que vai além das minhas capacidades. Mas podemos levá-lo até o templo e o Ancião cuidará dele por nós.

- Tudo bem! - Carragando Shiki nos braços - Neun me diga... Quais são suas capasidades?

- Você conhecerá com o tempo... - respondeu ele enquanto andavam em direção ao templo.

- Você me intriga Neun, e isso pode ser divertido... Ou não! - Seguindo o Neun em direção ao templo

"Um homem cego não pode desmaiar em paz sem que esqueletos e... Habitantes do país das maravilhas comecem a arrastá-lo enquanto conversam em voz alta?" Murmurou Shiki, removendo a venda. Sua voz, apesar do tom sarcástico, deixava transparecer exaustão.

Neun deu uma risadinha.

- Muito engraçado.

Shiki teve um mau pressentimento quanto a ele.

O homem com cabeça de coelho abriu as largas portas construídas com madeira.

- Sejam bem vindos à minha casa...

- Como? - Muito assustado com aquela afirmação de Neun

- Desculpe não ter informado antes. - Neun começou a acender velas para iluminar o exótico ambiente. Tudo era caprichosamente decorado com desenhos de dragões serpente e outros símbolos do Povo Celestial. Os objetos metálicos eram todos dourados e os tecidos todos vermelhos. No centro da sala havia uma mesa baixa e, em frente à ela várias, almofadas que serviam de assento.

- Por favor, sintam-se à vontade.

Shiki e Tod Blunt notaram uma bola de vidro sobre a mesa.

- Sou Neun, também conhecido como O Guaridão da Casa do Ancião, ou como o próprio Ancião. Mas devo-lhes dizer que, na verdade, o Ancião não é uma pessoa e sim um objeto mágico. - ele passou os dedos por sobre a bola de cristal. O artefato emitiu um brilho prateado. - Eu estava morto quando você me encontrou, Tod, mas graças ao portal que levou Kihn de volta à vida, eu também pude retornar ao mundo dos vivos. Assim que meus pés tocaram novamente o chão da real Terra do Exílio, eu pude sentir que alguém estava a caminho, que uma pessoa se aproximava, buscando por respostas, por isso o trouxe até aqui.

Neun voltou-se para Shiki.

- Sente-se, rapaz.

O homem com cabeça de coelho indicou uma das almofadas brancas.

Shiki, fazendo esforço para não perder sua consciência novamente, obedece Neun e se senta.

"Então, o Ancião pode responder minhas perguntas?" Indagou ele, fitando o chão. Sua voz parecia desprovida de fé.

- Claro que sim.

Neun entrelaçava as mãos (sem tocá-las umas nas outras) sobre a esfera brilhante.

- Você pode perguntar o que quiser. O Ancião me dará todas as respostas e eu as direi a você.

Nesse momento, várias perguntas ecoam na mente de Shiki. Perguntas que o atormentaram durante a vida inteira. Perguntas que ele nunca pôde responder, e que todas as respostas oferecidas a ele não pareciam suficientes.

Mas como se fosse impelido por alguma coisa, ele perguntou:

"Como eu posso trazer Nühr de volta?"

Shiki estranhou as palavras que disse assim que elas saíram de sua boca. Sim, ele queria saber aquilo. Mas não era... O que ele queria perguntar primeiro.

Neun abriu um largo sorriso, mostrando para ele seus dentes grandes de coelho.

- É um tanto engraçado escutar uma pergunta como esta. Alguém querendo dar a vida ao deus que domina a morte. Não acha que, talvez, Nühr possa estar feliz por finalmente ter podido sentir a sensação que ele fez todos os mortais que se foram sentirem um dia?

O homem com cabeça de coelho continuou a mover suas mãos sobre a esfera, que contava-lhe a resposta para a pergunta feita por Shiki.

- Trazer Nühr de volta seria como montar um quebra cabeça de mil peças espalhadas nas profundezas de um oceano vasto. - falou Neun interpretando os ensinamentos do Ancião. - E seria como se essas peças de quebra-cabeça não se encaixassem, pois já não fazem mais parte de um mesmo todo. Feiticeiros são como artesãos das almas, toda a energia que brilha dentro deles é transformada, mudada, absorvida e reconstruída. Nenhum Fragmento de Nühr é puro, todos eles contém fragmentos de diversas outras almas, lembranças e pensamentos.

Neun voltou a encarar Shiki, e disse:

- Essa é a resposta.

Sem nem mesmo pensar, outra pergunta escapa da boca de Shiki.

"Qual seria o resultado desse quebra cabeças deformado? Qual forma tomaria o completo dos pedaços do que outrora se chamava Nühr?"

Neun, através do triângulo formado entre os dedos de suas mãos entrelaçadas, observou a esfera brilhar em diferentes intensidades, interpretou o conhecimento do Ancião e respondeu:

- Formaria um Frankenstein. - respondeu o homem sorrindo levemente para Shiki com seus dentes de coelho. - Frankenstein é a parte costurada de muitas partes que já se foram. Frankenstein não é e nunca será o que suas partes foram em vida. Frankenstein é uma aberração da morte, os fragmentos malditos unidos por um homem que brincou de ser deus, mas ninguém pode ser deus além de um próprio deus...

Amarrando sua venda novamente em seu rosto, Shiki acaba deixando escapar.

"Não importa, desde que seja eterno."

E como quem tenta reafirmar um objetivo, ele pergunta.

"Como eu faço para sustentar mais de um fragmento de alma em meu corpo?"

O brilho da esfera se intensificou de uma maneira muito repentina, formando uma onda de luz percorrer a sala.

- Sustentar dois fragmentos de alma em um só corpo é como sustentar, navegando sobre um mar raivoso, vinte humanos em um bote onde só cabem dez. À medida que as pessoas entram no bote, todo o resto sente o desequilíbrio. Há chances do bote se firmar, assim como há chances de, no ato, o bote se virar. E uma vez que o bote se vira, todos afundam e se afogam. Não há mais volta. Para sustentar mais de um fragmento em um só corpo você deve ser, no mínimo, um bom marinheiro.

Shiki pensou por um breve momento e respondeu.

"Há um modo de fortalecer este corpo? Um simbionte talvez? Ou algum artefato que possa me ajudar a sustentar outros fragmentos?"

Neun ergueu as mãos sobre a esfera, que expeliu uma pequena nuvem de poeira brilhante, seguindo o movimento das palmas do homem coelho.

- Os homens que sobrevivem com dois fragmentos dentro de si são grandes homens. Para um grande homem, não há porque temer ter vinte humanos em seu bote onde só cabem dez, pois grandes homens controlam as ondas do mar, e quem tem o controle das águas jamais permite que o próprio barco afunde. Para ser um homem como este você precisa de poder, de muito poder, e o poder não é dado para alguém sem razão alguma. Se você deseja esse poder, lute por esse poder, evolua por esse poder e, se for preciso, faça como Vizzerdrix, morra por esse poder.

"Obrigado pelas... Respostas." Disse Shiki.

"Acho que minha última pergunta seria... O que temos para o jantar? Estou morrendo de fome."

Neun deu uma risadinha.

- Você só pode comer depois que pagar pela consulta ao Ancião.

"Muito bem, o que a existência onisciente quer de mim?" Respondeu Shiki.